Maria Inez Siqueira

domingo, 19 de janeiro de 2014

A FORÇA DE CADA UM.



Dia desses, conheci no Hospital das Clínicas, uma senhora de origem oriental, muito bonita, estava com seu marido que por sua vez era europeu, faziam um bonito casal.
Ela cardiopata e cirrótica estava lá a tratamento, começamos a conversar porque ambas estávamos com fome, teríamos que esperar por no mínimo três horas para que o resultado de nossos exames de sangue, ficassem prontos, e como chegáramos cedo, a fome já se fazia presente, mas, não podíamos sair do hospital nem para ir a lanchonete segundo nos informaram, e foi esse o assunto que iniciou a nossa conversa.
Ela me contou a história de sua doença, parecia um tanto abatida, desanimada e triste, penalizada eu resolvi lhe dizer alguma coisa animadora, -o quê, vamos e venhamos, nesses casos é muito difícil- alguma coisa que lhe fizesse ver que quanto mais triste e abatida ela ficasse, pior seria para sua saúde, pois a doença encontraria um corpo fraco e abatido e tomaria conta de tudo.
No começo da conversa ela me disse, que eu falava aquilo porque estava pela minha boa aparência, dava-se conta de que eu não tinha nada grave, e nesse caso a fiz saber o que eu estava fazendo ali, e quando soube que eu estava na fila do transplante e meu corpo lutava contra dois tumores no fígado, e mais uma cirrose biliar, ela começou a prestar mais atenção ao que eu dizia, porque ficou surpresa de eu estar com uma aparência tão saudável a despeito disso. Por incrível que pareça isso me dá crédito para falar de otimismo, aos pacientes que encontro pelos caminhos do meu próprio tratamento.
Por fim me contou que na verdade seu sofrimento vinha do fato de seu filho não lhe dar atenção, segundo ela, seu filho praticava esse esporte de lutas, o MMA, e estava sempre com um membro quebrado, se vangloriava de que aguentava sem reclamar, e dizia a sua mãe que a despeito do que ela estava passando e dos riscos que estava correndo, ela era um mulher forte.
Aquela senhora me disse mais de uma vez o quanto estava cansada de ouvir essa afirmação "você é forte", desde que anunciou sua doença. Não era isso que queria ouvir, mas sim, algo como, "vou estar com você sempre" ou "não sei como é isso, mas imagino que não seja nada bom, conte com meu afeto".
Para ela, ouvir dizer que ela era forte, era o mesmo que desprezar sua dor, seu medo, sua coragem, e eu fiquei pensando nisso, pois, eu também ouvi muito isso, "você é forte", e não me senti como ela, não senti desprezo nessas palavras. Mas, fiquei pensando nela, imaginei o seu filho, jovem, forte e saudável e entendi o que ela sentia.
Conforme os anos passam, e a idade avança, por mais que sejamos otimistas e saudáveis já sentimos limitações, um idoso não pode competir com uma pessoa jovem em muitas coisas, e dentre elas, atividades físicas pesadas, até pode, mas é certo que se sairá mal, e se somar a isso uma doença grave, não somente o físico fica ressentido como também o emocional.
Uma pessoa idosa com uma doença grave pode e deve ser forte, aliás é isso o que a vida de uma pessoa doente lhe obriga, "a ser forte". Mas a facilidade de se manter forte, já não é a mesma que na juventude, a sensibilidade é mais aguçada, uma doença mina não somente a parte física, mas o poder da vontade, tanto é que a maior luta na cura dos pacientes, é exatamente tentar manter a auto estima deles elevada. A tentação de se entregar, o cansaço, a tristeza são bastante grandes.
Eu me considero uma pessoa forte, sei que sou, por tudo o que vivi, e como  somente cada um de nós é que sabe o quanto suportou nessa vida, eu sei exatamente que sou muito forte, mas, muitas vezes me sinto fraca, indefesa, solitária, mesmo tendo o amor e compreensão de tantas pessoas queridas. Cada um tem uma forma de reagir isso é certo, no meu caso me permito chorar um pouquinho depois já lavo o meu rosto, olho em volta e esteja onde estiver, encontro mil razões para estar feliz, entretanto, esse é o "meu" caso.
Tenho uma vizinha que tem câncer, ela trabalha em dois lugares, é bonita e competente, porém fora das vistas das pessoas que não são íntimas, ela chora, ela chora todos os dias, ela começa a falar e chora, seu emocional está em frangalhos, e não é o caso de depressão, porque ela não está deprimida, está triste.
Mas o que eu quero mesmo dizer, é que não podemos ver uma pessoa passando por algum problema grave e dar de ombros tipo, "ela é forte". A nossa humanidade não nos permite isso, não permite que simplesmente concluamos que tal pessoa tem que ser forte, se fizermos isso, estamos indo contra a nossa humanidade, uma pessoa passando por um problema grave, precisa sim de mais atenção, e de mais carinho, isso é o que lhe dá forças para continuar, é isso que muitas vezes a mantém de pé.
O filho daquela senhora talvez só descubra isso quando ele mesmo começar a perder o seu vigor e sua força física, quando ele perceber que a vida bem antes de terminar, vai nos tirando muito do que temos na juventude. Todo mundo envelhece, a exceção de quem morre antes. Todos nós padecemos do declínio, e a medida com a qual nós compreendemos a dor da outra pessoa, talvez seja a mesma medida que um dia, compreenderão a nossa também.
Cada um tem um gênio, uma índole e aquela senhora me disse que acabaria denunciando o filho por negligência, ela estava mesmo muito brava. Ao fim, seu marido saiu de mansinho comprou lanche para nós três, demos a volta por dentro do hospital, e fomos a portaria para comer nossos lanches. Nenhuma de nós estava com restrição alimentar, a medida do hospital era para que se pudesse controlar os que estivessem.

Um comentário:

  1. Muito gostoso de ler !! Acredito q carinho e atenção faz muito bem quando estamos fragilizados ou não !!!!!! Mas a auto estima , é fundamental, o amor próprio, não pode faltar, para q saibamos enfrentar os grandes desafios da vida !!!!!! Uma ótima semana !!!!!!!

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